A
tarefa de construir um mundo melhor transcende a todas as gerações e o meio
ambiente é um tema fundamental na agenda de todos aqueles que detêm parcela do
poder econômico, político e administrativo, sobretudo, do Poder Executivo em
toda a constelação política.
Por
ser um problema que interessa a todos em conjunto agora e no futuro, nas
próximas gerações, o tema ligado ao meio ambiente deve ser um dos objetivos
mais importantes da administração pública, especialmente dos Municípios, onde
os problemas acontecem.
Mas
como as ações voltadas para o meio ambiente exigem muitos recursos, persistência,
dedicação e projetos e cujos resultados não aparecem imediatamente, os
políticos não dão a atenção devida, preferindo concentrar suas ações nas
políticas públicas de execução de obras, que conferem maior visibilidade à sua
gestão, pois o político sempre governa hoje, com os olhos voltados para a
próxima eleição.
O
nosso constituinte absorvendo a experiência vivenciada pelos países europeus
que foram vítimas da devastação ambiental desencadeada pelas guerras,
explorações econômicas do solo, subsolo, da água e dos recursos naturais, que
sempre foram considerados como recursos inesgotáveis, perceberam que se nada
fosse feito, o prejuízo seria irreversível tanto para os habitantes atuais da
Terra e principalmente, para as próximas gerações.
Nessa
medida, os constituintes de 1988, transpuseram as normas da Constituição
portuguesa que prevê expressamente o princípio
da solidariedade entre gerações como uma forma de obrigar as gerações
presentes a incluir nos projetos de governo, uma agenda de ponderação incluindo
os interesses das presentes e futuras gerações.
Norberto Bobbio[1], ao analisá-los, dispõe:
“Ao lado dos direitos sociais, que foram chamados de direitos de segunda
geração, emergiram hoje os chamados direitos de terceira geração, que
constituem uma categoria, para dizer a verdade, ainda excessivamente
heterogênea e vaga, o que nos impede de compreender do que efetivamente se
trata. O mais importante deles é o reivindicado pelos movimentos ecológicos: o
direito de viver num ambiente não poluído”.
Interpretando a visão
do STF, acerca do tema, o Ministro Carlos Ayres Brito [2] pondera que:
“Efetivamente, se consideramos a evolução histórica do
Constitucionalismo, podemos facilmente ajuizar que ele foi liberal,
inicialmente, e depois social. Chegando nos dias presentes à etapa fraternal
esta fase em que as constituições incorporam às franquias liberais e sociais de
cada povo soberano a dimensão da Fraternidade; isto é, a dimensão das ações
estatais afirmativas, que são atividades assecuratórias da abertura de
oportunidades para os segmentos sociais historicamente desfavorecidos, como,
por exemplo, os negros, os deficientes físicos e as mulheres (para além,
portanto, da mera proibição de preconceitos). De par com isso, o
constitucionalismo fraternal alcança a dimensão da luta pela afirmação do valor
do Desenvolvimento, do Meio Ambiente ecologicamente equilibrado, da Democracia
e até de certos aspectos do urbanismo como direitos fundamentais. Tudo na
perspectiva de se fazer a interação de uma verdadeira comunidade; isto é, uma
comunhão de pela consciência de que, estando todos em um mesmo barco, não têm
como escapar da mesma sorte ou destino histórico”.
Um
dos precursores de nossa Constituição o eminente Catedrático de Coimbra JOSÉ
JOAQUIM CANOTILHO, figura ímpar na construção do constitucionalismo lusitano
que exerceu forte influência na elaboração da nossa Carta de 1988, “os interesses destas gerações são
particularmente evidenciáveis em três campos problemáticos: i) o campo da alterações
irreversíveis dos ecossistemas terrestres em consequência dos efeitos
cumulativos das atividades humanas (quer no plano espacial, quer no plano
temporal); ii) o campo do esgotamento dos
recursos, derivado de um aproveitamento não racional e da indiferença
relativamente à capacidade de renovação e da estabilidade ecológica; iii) o campo dos
riscos duradouros”
A
reflexão sobre o meio ambiente sempre foi concebido a partir de ideias
imediatistas, do progresso econômico desenfreado, de busca do lucro, que
tratava de tema restrito às gerações futuras, parecendo mesmo que o meio
ambiente era um entrave ao desenvolvimento.
Dessa
forma a Constituição Federal buscando a efetividade desse direito de 3ª geração
conclama em seu art. 225:
“Art. 225. Todos têm direito ao meio
ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à
coletividade o dever de defendê-lo e preservá- lo para as presentes e futuras
gerações”.
Nesse
passo, a Constituição brasileira, a exemplo da portuguesa e demais países
europeus, tratou de incluir em seu texto a política
dos interesses das próximas gerações, como um ponto de partida a
concretização de ações materiais de efetivação do princípio da preocupação e da preservação ambiental, configurando
com um verdadeiro princípio fundante e primário da preocupação prolongada com a
causa do meio ambiente.
Nesse
aspecto, convém ressaltar que não se trata de mero enunciado programático ou um
protocolo de intenções. A Constituição Federal impõe ao Poder Público e a
coletividade o dever de defender o meio ambiente.
Para
concretizar a efetividade da norma, a Lei 7.347, de 24 de julho de 1985, dispõe que:
“Art. 1º Regem-se pelas disposições desta Lei, sem
prejuízo da ação popular, as ações de responsabilidade por danos morais e
patrimoniais causados:
l - ao meio-ambiente; (...)”
Dentre
os vários legitimados, com competência para propor ação civil pública, visando
a defesa dos direitos coletivos, difusos e individuais homogêneos, está o Município
(art. 5º,III).
A
Constituição Federal confere aos Municípios competência para legislar sobre
assunto de interesse local e suplementar a legislação federal e a estadual no
que couber, prestar com cooperação técnica e financeira da União e do Estado,
serviços de atendimento à saúde à população e promover a proteção do patrimônio
histórico-cultural local, observada a legislação e a fiscalização federal e
estadual (CF, art. 30, I,II, VII e IX).
Atualmente,
na agenda do Tribunal de Contas do Estado, consta o tema meio ambiente que deve
ser auditado e fiscalizado, ao lado de outros itens como saúde, educação,
admissão de pessoal, gestão pública e orçamentária e outros, merecendo a glosa,
quando o Município não adota uma política pública voltada para o meio ambiente.
Pensando
nisso, já em 2006, quando assessorava o Sr. Prefeito Município de Guareí, o
meio ambiente mereceu especial atenção da administração, de sorte, que como
ponto de partida, por determinação do Prefeito “Zé Neves” passamos a traçar um
articulado projeto referente ao meio ambiente, iniciando-se pelo estudo e
construção do Aterro Sanitário Municipal, visto que sem a obra, as ações
seguintes seriam inviáveis.
Aprovado
o local, para a construção do Aterro, nos apressamos na elaboração e
encaminhamento ao legislativo municipal de um moderno projeto de lei,
incorporando as ações programáticas e sancionatórias visando compelir toda a
comunidade ao grande tema de interesse geral.
Para
tanto, a lei aprovada previu em seu bojo, as definições de todos os tipos de
lixo e sua origem, o tratamento e destinação. Através de um programa amplo de coleta
seletiva de lixo, contemplou-se a participação de associações formadas por
catadores de materiais recicláveis, convênios com outros órgãos ou municípios,
na busca de solução comum dos problemas que afetam toda a região.
Ao
lado dessas ações sociais e administrativas, a lei prevê sanções para aqueles
que ousam desafiar a postura municipal. Várias palestras foram feitas,
incluindo os agentes comunitários de saúde, na tarefa de conscientização e
orientação da população, agregando credibilidade às ações desenvolvidas.
Para
completar a lei prevê no seu texto, os aspectos jurídicos e administrativos na
aplicação de penalidades, em observância do devido processo legal, a
proporcionalidade das sanções e o julgamento de recursos por órgão colegiado.
Essa
lei, considerada com a espinha dorsal de todo o sistema do meio ambiente, abriu
caminho para que outras normas fossem aprovadas, dando maior efetividade às
ações de controle, preocupação prolongada e fiscalização duradoura, contra a ocorrência
de fatos potencialmente lesivos ao meio ambiente.
Para
tanto, foram aprovadas leis que visam o controle de emissão de fumaça preta, da
queimada, da origem legal da madeira comercializada no Município e ainda foi
inserido no seu texto a exigência para que uma empresa possa firmar contrato
com a Prefeitura, deve instruir o procedimento com certidão de que não é
poluidor e não cometeu nenhuma infração ao meio ambiente.
Assim,
a lei atinge também o bolso dos poluidores que se a Prefeitura observar e
cumprir a norma, não poderá mais fazer negócio com o Município.
As
medidas tomadas serviram para que Guareí subisse na lista dos Municípios que
mais se preocupam com o meio ambiente. Saindo do último lugar em que se
encontrava, o Município de Guareí, atingiu o ápice da lista, principalmente
depois que fora construída a lagoa de tratamento.
Se
continuarem investindo nesse quesito, melhorando cada vez o sistema de limpeza
pública, reciclando cada vez mais o material coletado, fazendo a manutenção periódica
do aterro e exercendo a fiscalização contra abates clandestinos, venda de madeira
sem origem, recuperação dos mananciais e reflorestamento de áreas degradadas,
Guareí estará figurando no topo da lista dos municípios ecologicamente corretos
e apto a receber recursos procedentes de várias fontes.
Pensando
nisso, foi aprovada lei criando o
Conselho Municipal do Meio Ambiente e o Conselho Gestor, semelhante a uma
autarquia municipal, autônoma, independente e responsável pelo gerenciamento
dos recursos do Fundo Municipal do Meio Ambiente, que seria fiscalizado pelo
Tribunal de Contas, pela Câmara Municipal e pelo Ministério Público, além da participação
das associações que tenham como objetivo a proteção ambiental.
Através
desse Fundo que não tem ingerência do Prefeito, mas que deverá ser incentivado
e apoiado pelo Município, com dotação orçamentária e contratação de profissionais
ligados ao meio ambiente, seriam elaborados todos os projetos de recuperação
das áreas afetadas, preparação de disciplinas curriculares do ensino público
fundamental e a execução de obras, autorizando as despesas e prestando contas,
como se fossem um órgão público que sofre controle da sociedade, da Câmara
Municipal do Tribunal de Contas e do
Ministério Público.
Por
meio de ações integradas e articuladas com outros órgãos do Município e do
Estado, envolvendo a iniciativa privada, o Conselho Municipal de Guareí,
estaria apta não só para o discurso estéril, mas instrumentalizado para
executar ações concretas para a melhoria das condições ambientais.
Se as providências não forem tomadas ou não
forem dada continuidade no projeto de defesa do meio ambiente, mediante uma
política pública abrangente e séria, penso que é perfeitamente possível a
tomada de providências por parte dos legitimados do art. 5º da Lei 7.347/85, concernentes
a eventual ajuizamento de ação civil pública, por omissão e a emissão de parecer desfavorável à aprovação das contas, pelo TCE ou pelo menos, a formação de apartados para instruções e encaminhamento ao Ministério Público, a fim de que tome as providências, incluindo no polo passivo o Município omisso, que ainda ficará sujeito a decretação de inadimplência, ou seja, inabilitado para receber recursos por meio de transferências voluntárias.
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